Convicções, Emoções e ... o célebre binómio Qualidade / Preço

Em novembro passado estive à conversa com um distribuidor alemão de produtos alimentares que me comentava:

“Para o meu negócio só existem 3 categorias de produtos: vegan, produtos com história e os outros. Consigo trabalhar com o retalho independente se fores competitivo nas duas primeiras categorias. O resto … é preço.”

Lembrei-me desta conversa quando caminhava em direcção ao escritório, por estas ruas do centro do Porto onde
todas as semanas abrem (e por vezes fecham) novos projectos. Lojas que buscam a sua afirmação num mercado fortemente dominado pelas grandes insígnias de distribuição nacional e internacional, apresentando produtos diferentes que apelam na sua maioria a nichos de mercado.

Dou por mim a concordar com o meu amigo alemão e pensar que uma das principais consequências do domínio do retalho pelas insígnias da distribuição (alimentar e não alimentar) foi a alteração das motivações de compra pelos consumidores, assumindo estes que todos os produtos cumprem com critérios de qualidade mínimos garantidos. Esta é uma mudança extremamente importante de paradigma, pois os critérios de compra passam a ser orientados por convicções de consumo, ligação emocional à marca ou oportunidade de negócio (preço).

A compra por convicção continua a representar um nicho de mercado. Falamos em convicção porque a sua escolha não está tanto ligada a marcas, mas opções de vida mais saudáveis (alimentos, roupa e outros bens diversos fruto de uma económica mais sustentável). Este segmento de consumidor por norma comunica bem em favor das suas convicções, gerando muitas vezes a ideia que o segmento de consumo é bem maior que a realidade. A sua influência é crescente como se constata pelo espaço que os novos e “tradicionais” media lhe dedicam.
A ideia que os movimentos de promoção de alimentação alternativa são uma moda passageira é todavia ilusória.  A revista mensal da Bimby (uma outra subcultura) dedica-lhe um mínimo de 2 páginas por edição e documentários como Cowspiracy têm transformado o modo como as pessoas percepcionam a industria agro-alimentar. Tendo um dimensão de negócio ainda pequena, tende a constituir-se como um lobby de influência poderoso.
 
A compra de produtos marca de fabricante é hoje um acto emocional. Face ao nível de elevada qualidade patente nos produtos de marca de distribuição, não sobram muitas alternativas aos fabricantes que apostar na diferenciação pela inovação e no reforço da relação emocional. Ser hoje uma marca passa em grande medida por não defraudar os consumidores em termos de qualidade intrínseca do produto, do serviço de pós-venda, mas sobretudo construir uma identidade ser capaz de comunicar de forma perceptível os valores e história que estão na origem.

Este esforço é objectivamente um investimento grande, mas necessário para assegurar a sobrevivência das marcas porque a linha que separa hoje as marcas de fabricante e as marcas de distribuição é cada vez mais ténue aos olhos do consumidor. Em primeiro lugar pela acima citada questão da qualidade mínima garantida. Depois porque ao inverso de um passado não muito distante, as marcas de distribuição têm investido num design de embalagens cada vez mais apelativo distanciando-se da imagem de “marcas brancas”.

Diferenciação pela inovação do produto, pelo design e por uma comunicação que reflicta os valores da marca são as alavancas para as marcas não caírem na avaliação pela qualidade / preço, onde as marcas de distribuição (ou cadeias de retalho) serão inevitavelmente mais competitivas.

O desafio de afirmação para as marcas de fabricante vai ganhando novas nuances à medida o consumidor se torna mais exigente ao nível da qualidade mínima garantida, do design e dos valores da marca. Uma exigência que acompanhada por um numero cada vez menor de canais de distribuição independentes disponíveis.

Aqui chegados, sobreviverão as marcas que conseguirem melhor comunicar a sua singularidade com os consumidores. Um desafio grande, mas alcançável para as empresas que dirijam os seus esforços de forma segmentada e apelativa.

Votos de uma excelente semana,
 
Carlos Coelho
Senior Partner @ The Portuguese Diet 
 

(texto publicado originalmente na newsletter The Portuguese Diet). 





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