marketing não é para intelectuais

Há varias semanas que queria escrever um texto sobre marketing e a sua importância como ferramenta de desenvolvimento de negócio para as pme’s. Todavia quando reli a primeira versão deste texto senti que para muitos poderia ser um documento interessante, mas sem aplicabilidade no quotidiano da sua empresa.

Optei por isso por uma breve reflexão sobre 3 notícias que devem interessar à maioria das pme’s e têm passado despercebidas nesta profusão noticiosa dominada pela disputa politico-partidária.

A primeira notícia é um relatório da OCDE que reitera a revisão em baixa do crescimento da economia mundial realizada Julho pelo FMI com as seguintes perspectivas:

 
Mundo Zona Euro EUA China India Medio Oriente
3,8% 1,7% 3,0% 6,3% 7,5% 3,8%

A confirmação de uma zona euro relativamente estagnada, a estagnação de mercados como o Brasil e Angola, a desaceleração do mercado chinês são ilustrativas dos desafios que as empresas enfrentarão para desenvolver negócio.

A segunda notícia refere-se à alteração da política do filho único na China, que favoreceu as empresas de produtos para bebé com subidas de valor em bolsa de 40%. A perspectiva de nascimento de 3 a 5 milhões de crianças anualmente abre excelentes oportunidades de negócio para empresas em todo o mundo. A japonesa Okamoto Industries, um dos maiores fornecedores de preservativos do mercado asiático, encarou esta mudança com menos entusiasmo ao ver as suas acções caírem 10%.

Depois dos táxis, o efeito UBER chega agora às lavandarias e já fez tremer o gigante do sector 5àSec. Novas formas de fornecer o serviço de limpeza de roupas com foco no benefício do consumidor relançaram o negócio em França com o nascimento de novos conceitos de negócio.
Limpeza a Seco 2.0: Fundadores da soyezBCBG em Paris
Em que medida é que estas 3 noticias – porventura distantes dos seus mercados alvo, tipologia de clientes e sector de actividade – podem influenciar a vida sua empresa?

Podem (e seguramente irão) se as interpretarmos à luz destas conclusões:
  • O crescimento de uma empresa / marca será realizado “roubando” quota de mercado a outra(s) empresa(s).
  • As decisões políticas de países distantes podem da noite para o dia transformar as condições de mercado (vide embargo russo e fim da indexação do franco suíço ao euro); 
  • Os mercados são um ser vivo, onde as ameaças e oportunidades nem sempre surgem das formas mais óbvias ou expectáveis;
  • A forma mais sensata, económica e potenciadora de resultados é apostar na diversificação de mercados através de uma politica comercial agressiva (mas não intrusiva) que permita manter a marca / empresa visível junto de clientes potenciais;
Face a este cenário, o que pode uma pme portuguesa – onde normalmente os recursos humanos são “esticados” ao limite da sua competência e versatilidade, e os orçamentos de marketing são inferiores a 1% do volume de negócios – fazer para competir à escala internacional?

Deve em primeiro lugar resistir à tentação de avançar com iniciativas avulsas como participar em feiras, remodelar o site para promover vendas online ou fazer uma página do facebook para lhe trazer mais clientes. Deve sim, traçar um plano de trabalho que responda às seguintes questões:
  • Quais as são vantagens competitivas da minha empresa / marca
  • Quais os benefícios diferenciadores a comunicar os meus clientes / consumidores
  • Qual o perfil do consumidor mais favorável para a empresa /marca
  • Qual o perfil de clientes e prescritores que devemos priorizar o contacto
  • Quais os meios mais favoráveis (feiras, visitas a clientes, mailing, redes sociais, etc) para alcançar clientes potenciais, prescritores e consumidores.
É aqui chegados que muitos empresários reconhecem o mérito do processo, mas hesitam em investir no planeamento e preferem “meter mãos à obra”.

Sucede que vivemos numa economia global em lento crescimento e em que os mercados mais apetecíveis são mercados maduros. Assim sendo, o sucesso depende em partes iguais da capacidade de iniciativa e do nível de preparação.

Os espaços nas lojas serão disputados à concorrência. Isto implica ter mais que um produto melhor. Implica demonstrar ao comprador os benefícios mensuráveis em optar pela nossa proposta em detrimento de um fornecedor actual. De outra forma, ninguém muda por mudar, ou por um valor relativamente baixo (no pior dos cenários pressiona o fornecedor actual a aproximar preços).

É por isso muito importante que as empresas independentemente da sua dimensão tenham um profissional (a tempo inteiro ou parcial) dedicado a dinamizar o marketing da marca / empresa.

Alguém que assegure que os esforços de inovação e as vantagens competitivas da empresa são traduzidas em benefícios perceptíveis para clientes, prescritores e consumidores. Alguém que potencie a partir da retaguarda os esforços da equipa comercial, contribuindo para que o custo de contacto seja o mínimo necessário para assegurar a venda.

É por isso que o marketing do presente e do futuro é para fazedores.
Para gente que pensa a marca/empresa para os clientes (retalho/distribuição), prescritores e consumidores. Profissionais que traduzem vantagens em benefícios, ajudam a eleger o caminho mais curto (e rentável) para chegar aos consumidores certos. Não é para grandes empresas, mas para todas as empresas que têm a expectativa de ter um futuro.

Votos de uma excelente semana,
 
Carlos Filipe Coelho
Senior Partner @ The Portuguese Diet
PS: Terminei este texto na sexta-feira, horas antes dos atentados de Paris.
Quatro dias depois, ainda em estado de choque, é importante começarmos a compreender o que é o Daesh e o que está verdadeiramente em causa. Ricardo Costa, director do Expresso, escreveu um texto lúcido que ajuda a perceber o presente e as implicações politicas e de segurança interna na Europa.


(texto publicado originalmente em 17.Novembro.2015 na newsletter The Portuguese Diet).

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